Crise com Congresso e tarifa de Trump ajudam a reverter queda de Lula, avalia cientista político
Em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, Maurício Garcia analisou o resultado da pesquisa Quaest divulgada nesta quarta-feira (16)

A nova rodada da pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta quarta-feira (16), apontou melhora na avaliação do governo Lula. Para o cientista político Maurício Garcia, ouvido no programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, o resultado é influenciado por dois fatores distintos: a disputa política envolvendo o Congresso Nacional e o governo federal, que mobilizou a base popular, e a taxação de produtos brasileiros anunciada pelo ex-presidente Donald Trump, que impactou segmentos de maior renda.
Garcia lembra que o embate entre o governo e parlamentares como Davi Alcolumbre e Hugo Motta teve como pano de fundo uma disputa por poder político e orçamentário. Segundo ele, essa tensão foi percebida pela população como um confronto entre "ricos e pobres", com potencial de mobilizar o eleitorado de menor renda.
“Era uma briga do governo federal com o Congresso, basicamente entre Alcolumbre, Hugo Motta e o ministro Fernando Haddad, mas que envolvia o governo como um todo”, explicou. Esse conflito, segundo ele, foi determinante para reacender o apoio de parte do eleitorado mais pobre ao governo Lula.
O segundo fator de impacto foi a taxação de 50% sobre produtos brasileiros, anunciada por Donald Trump. Para Garcia, essa medida teve maior ressonância entre os brasileiros de maior renda e escolaridade, especialmente aqueles com ligação direta com o setor produtivo e com o comércio exterior.
“Os mais ricos têm maior grau de instrução e acompanham melhor o que está acontecendo no mundo. Eles sabem o quanto essa taxação importa para a economia brasileira como um todo”, afirmou. Já os mais pobres, explicou, só sentem os efeitos econômicos quando “o café tá caro, o arroz tá caro, a carne tá cara”.
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Melhora real, mas dependente de como o governo conduzirá o cenário
Apesar da melhora na percepção geral, Garcia pondera que o resultado da pesquisa depende da forma como o governo lidará com os dois eixos de crise. “Vai depender de como ele vai dosar e levar essa negociação daqui para frente, tanto com o governo Trump quanto com o Congresso”, disse.
A pesquisa apontou que 19% dos entrevistados disseram que Trump está certo em impor tarifas ao Brasil. Para o cientista político, esse número representa um segmento ideologicamente alinhado à extrema direita. “É uma fatia da população que sempre foi muito à direita extrema, e que acredita em tudo que Trump fala e que Bolsonaro fala. Eles aceitam de uma forma quase cega”, comentou.
Garcia destacou que, embora haja polarização, a maioria dos entrevistados deseja evitar choques. “O brasileiro quer pacificar a situação. Quer seguir em paz sem nenhum grande atrito entre os dois países”, afirmou. Para ele, esse comportamento está relacionado ao receio da população de sofrer consequências econômicas.
Segundo a pesquisa, 84% dos brasileiros defendem que governo e oposição se unam para proteger o país. Garcia citou o caso do governador Tarcísio de Freitas, que tentou adotar essa postura, mas foi rechaçado por setores bolsonaristas.
“Essa postura foi exatamente a buscada num primeiro momento pelo governador Tarcísio. O problema é que isso bateu mal dentro do segmento mais radical bolsonarista, principalmente ligado ao próprio Bolsonaro e seu filho”, afirmou.
Carta de Trump tem influência limitada
Questionado sobre o potencial da carta de Trump em influenciar as eleições, Garcia avaliou que o impacto é pequeno. Segundo ele, o teor da carta é pouco conhecido pela população e envolve aspectos complexos de diplomacia internacional.
A percepção positiva do governo Lula, segundo Garcia, está ligada a como os efeitos das medidas recentes serão sentidos na vida cotidiana das pessoas. “Tudo vai depender do quanto essas ações, na prática, efetivamente, serão sentidas no bolso”, afirmou.
Para ele, os mais ricos já sinalizaram uma reação diante do risco econômico, mas o peso maior será sentido entre os mais pobres, que são numericamente maioria no país. “A questão é o tempo. Ainda temos mais de um ano até as eleições. É preciso ver como o governo vai conduzir sua narrativa e suas explicações até lá.”