Congresso agiu dentro da Constituição ao derrubar aumento do IOF, afirma tributarista
Mary Elbe Queiroz aponta abuso do Executivo e diz que o Legislativo exerceu seu papel ao suspender aumento do IOF com fins arrecadatórios

A pós-doutora em Direito Tributário Mary Elbe Queiroz considera constitucional a decisão do Congresso Nacional de derrubar o decreto presidencial que aumentava as alíquotas do IOF.
Para ela, que também é e presidente do Centro Nacional para a Prevenção e Resolução de Conflitos Tributários (Cenapret), houve extrapolação do poder regulamentar por parte do Executivo.
“O presidente tem o poder, pela Constituição, de baixar decreto para aumentar ou reduzir esses impostos, mas dessa vez foi feito um aumento de alíquota com fins arrecadatórios”, afirmou a tributarista em entrevista ao programa Passando a Limpo, da Rádio Jornal, nesta segunda-feira (30).
Segundo Queiroz, esse uso do imposto com finalidade fiscal descaracteriza a função extrafiscal do tributo e, por isso, a medida foi inconstitucional.
Ela cita o artigo 49, inciso V da Constituição, que garante ao Legislativo o poder de suspender atos do Executivo que ultrapassem sua função regulamentar. “Foi exatamente isso que aconteceu.”
Fim arrecadatório fere a natureza do IOF
Assim como o IOF, o IPI, o imposto de importação e o imposto de exportação possuem a mesma configuração, sem obedecer o princípio da anterioridade, para permitir a regulação de mercado.
Questionada sobre a possibilidade de uma regra que tornasse válida a cobrança apenas a partir do próximo ano, Queiroz afirmou que o problema não está no prazo de vigência, mas no desvio de finalidade. Ela reiterou que o objetivo desses quatro tributos é a regulação de mercado, e não a arrecadação direta.
“O governo não pode dizer que não está escrito na Constituição que esses impostos são apenas para regular o mercado. Mas o objetivo do dispositivo legal é esse. A arrecadação é indireta. O objetivo primeiro é regulamentar o mercado”, explicou.
Ela comparou a situação ao imposto seletivo previsto na reforma tributária, que também possui finalidade extrafiscal. “Ele arrecada como consequência, mas tem como objetivo princípios como o meio ambiente, a saúde. É o caso do IPI, IOF, imposto de importação e de exportação.”
Medida Provisória não deveria prosperar
Sobre a Medida Provisória editada pelo governo após acordo com a presidência da Câmara, Mary Elbe Queiroz foi taxativa: “A rigor, ela não deveria sobreviver”. A especialista mencionou que, segundo informações divulgadas pela imprensa, o Congresso teria derrubado o decreto não por sua inconstitucionalidade, mas por questões políticas, como o não pagamento de emendas.
"Hoje está tudo um pouco confuso. Os objetivos constitucionais não estão sendo cumpridos. A contradição aos atos do governo também não está sendo feita com base em princípios constitucionais”, criticou.
Ela finalizou com uma reflexão sobre o foco da política fiscal do país: "Por que só se pensa em aumentar imposto e não se pensa em reduzir ou readequar o gasto? Se for assim, temos um buraco sem fundo. Aumenta gasto, aumenta arrecadação, aumenta imposto. E aí se viola a Constituição. E como é que fica o contribuinte? Só tem que pagar?”, concluiu.